O panorama atual da produção de leite no Brasil permanece altamente diversificado, abrangendo desde grandes produtores que entregam milhares de litros diariamente até produtores de subsistência, caracterizados por uma tecnificação e rentabilidade mais modestas dentro do setor.
De acordo com informações do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) e da Embrapa, a média anual de produção de leite por hectare no país não excede 4.000 litros, e os maiores produtores, mais especializados, são responsáveis por 80% da produção nacional.
Nesse cenário heterogêneo, a flutuação no preço do leite e as variações nos custos em relação ao mercado agrícola criam um ambiente de incerteza, especialmente para propriedades com tecnificação moderada. Portanto, a sustentabilidade desses perfis de propriedade está intrinsecamente relacionada a estratégias para aumentar a produtividade, seja aumentando a produção de leite ou reduzindo os custos de produção.
E aqui surge a grande questão: como aumentar a produtividade a um custo reduzido? Respondendo a essa pergunta, apresentamos algumas dicas sobre como aumentar a eficiência e a produção de leite sem comprometer significativamente os custos.
Como aumentar a produtividade?
A produtividade é definida como a eficiência na utilização de recursos para alcançar resultados previamente definidos e julgados como satisfatórios. Portanto, a eficiência é a palavra-chave na formulação dos princípios para avaliar os diferentes setores da fazenda, começando pela identificação dos setores que apresentam desafios mais significativos.
1. Identificar quais os setores mais problemáticos
Para uma identificação ágil dos setores mais problemáticos, é possível adotar a estratégia de hierarquização de tarefas. A qual consiste em definir e subdividir os setores de maneira simples, de modo a abranger as principais áreas.
Após essa definição, deve-se questionar quais são os principais problemas de cada setor, a exemplo:
- Mão de obra: divergências entre funcionários; sobrecarga de trabalho; processos trabalhistas; funcionários inexperientes;
- Cria e recria: falta de silagem; bezerras doentes; diminuição do ganho de peso;
- Vacas em lactação: número alto de casos de mastite; muitas vacas com problema de casco; queda da produção;
- Insumos: trator quebrado; falta de óleo diesel; quebra da bomba de ordenha.
Após a identificação dos problemas, é importante estabelecer uma lista hierárquica de cada setor para a resolução. Essa lista pode ser dividida em três grupos prioritários:
- Problemas que exigem atenção imediata e urgente;
- Problemas de solução mais simples;
- Problemas de resolução complexa ou que demandará mais tempo.
Figura 1: Classificação dos problemas segundo a classificação de prioridades. Fonte: O autor.
Com base na lista elaborada, é crucial que os problemas identificados como urgentes sejam abordados prioritariamente, seguidos pelos mais simples e, por fim, pelos mais complexos.
É importante destacar que, sempre que possível, pode haver resolução concomitante de vários pontos ao mesmo tempo. Contudo, dada a complexidade das atividades diárias em uma fazenda de leite, quanto mais rigoroso no planejamento de resolução dos desafios, maiores são as chances de sucesso.
2. Análise de viabilidade de cada setor
Por decorrência das interações entre os fatores econômicos que influenciam o comércio nacional e internacional, tais como os preços dos grãos, dos insumos agrícolas e da mão de obra, juntamente com o equilíbrio das exportações, exercem um impacto direto na variabilidade do custo total de produção do leite. Essa dinâmica resulta em uma redução na lucratividade, especialmente diante das flutuações no valor pago por litro. Isso impacta prontamente os produtores, especialmente aqueles que não têm um controle sistemático sobre sua produção.
Sendo assim, compreender a estrutura das despesas e avaliar a viabilidade financeira de cada setor é fundamental para tomar decisões quanto à continuidade da produção. O primeiro passo para alcançar essa compreensão é criar um fluxo de caixa, o qual permite mensurar tanto as entradas quanto as saídas de dinheiro dentro da fazenda.
O fluxo de caixa deve abranger todo o movimento de entrada e saída de dinheiro nos principais setores da fazenda durante o mês. Os valores destinados a despesas como sanidade, mão de obra, nutrição, insumos, plantação, manutenção, terceirizados, energia, água, entre outros, devem ser cuidadosamente categorizados em uma planilha ou tabela, seja ela digital ou feita manualmente.
Da mesma forma, os valores provenientes da venda de leite, animais, silagem, máquinas, entre outros, devem ser categorizados. Isso possibilita a subtração entre os valores de entrada e saída, resultando no valor final disponível.
Figura 2: Exemplo de fluxo de caixa de uma fazenda. Fonte: Rehagro (2023)
Essa prática fornece uma compreensão nítida da liquidez da fazenda, tornando mais fácil avaliar a disponibilidade de recursos financeiros para cumprir obrigações imediatas e para considerar as previsões de investimentos futuros.
Um segundo passo crucial consiste na elaboração de uma planilha de custo de produção para analisar a previsão dos diversos setores em termos do valor investido em relação à receita gerada em cada área. O custo de produção abrange tanto despesas diretas quanto indiretas relacionadas à atividade produtiva, possibilitando uma análise detalhada da eficiência de cada setor e a elaboração de estratégias para otimização de áreas com custos elevados.
Figura 3: Exemplo de custo de produção de uma fazenda. Fonte: Rehagro (2023)
Assim como no fluxo de caixa, é essencial categorizar os custos em cada setor no qual houve saída de dinheiro ao longo dos meses. Essa categorização pode abranger despesas como insumos, mão de obra, medicamentos, manutenção de equipamentos, entre outros. A partir da totalização desses custos, realiza-se a divisão pela quantidade de leite produzido, resultando no custo de produção por litro de leite.
Desse modo, é possível desmembrar esse valor para analisar o impacto de cada setor no custo total de produção do leite. Essa abordagem permite uma avaliação detalhada de como cada componente contribui para o custo final. Com essa informação em mãos, torna-se viável identificar estratégias eficazes para mitigar eventuais falhas nos setores menos eficientes, otimizando assim o processo produtivo.
Aumentar a produção de leite em uma vaca não se traduz automaticamente em maior rentabilidade. Compreender os processos que conduzem ao aumento da produção de leite é crucial para obter resultados expressivos e positivos no fechamento financeiro.
3. Melhoramento genético
O aprimoramento genético do rebanho é inquestionavelmente um dos fatores mais significativos para impulsionar a produção leiteira. Esse aprimoramento não se limita apenas ao potencial de produção de leite da vaca; ele também está interligado com vários fatores importantes, como por exemplo:
- Conformação do animal;
- Predisposição a doenças genéticas;
- Facilidade de parto;
- Quantidade de sólidos totais produzidos;
- Facilidade de ordenha;
- Eficiência na conversão alimentar.
Para obter ganhos genéticos eficientes em uma fazenda de leite, a inseminação artificial (IA) e/ou a Inseminação Artificial em Tempo Fixo (IATF) surgem como ferramentas mais rentáveis e acessíveis. Esses métodos proporcionam um notável aprimoramento aos rebanhos em um período de 3 a 4 anos, apresentando ganhos substanciais quando comparados à montagem natural com touros fixos na propriedade.
De acordo com dados da Associação Brasileira de Inseminação Artificial (Asbia), no primeiro semestre de 2021, mais de 16 milhões de doses de sêmen bovino foram movimentadas no país, sendo que 86% das inseminações foram realizadas por meio da IATF. Esse aumento expressivo destaca a crescente tecnificação na produção brasileira, demonstrando a viabilidade e a rentabilidade dessa abordagem, especialmente no contexto da pecuária leiteira.
Dessa forma, um planejamento genético cuidadoso, considerando o grau de sangue do rebanho em relação às condições de criação, torna-se essencial para alcançar os objetivos de produção estabelecidos.
4. Aumentar taxa de serviço
Dentre os indicadores reprodutivos, a taxa de serviço é a que podemos agir de forma mais rápida para aumentá-la, e tem impacto direto no aumento dos indicadores reprodutivos nas fazendas.
Contudo, a observação do cio não é uma tarefa simples, especialmente em animais de alta produção ou sujeitos a desafios ambientais, como estresse térmico ou condições desfavoráveis de acomodação. Esses animais frequentemente apresentam cios curtos e, muitas vezes, silenciosos, o que torna a detecção mais difícil, especialmente para observadores inexperientes.
Para contornar esse desafio, podem ser adotadas medidas simples, como o uso de ferramentas que auxiliam na detecção, como a raspadinha e o marcador bastão. Esses instrumentos são aplicados ou esfregados na região dorso-caudal dos animais. Quando a vaca entra no cio e permite a monta por outros animais, ocorre um atrito, resultando na remoção superficial da marcação. Esses métodos mostram-se economicamente mais viáveis quando comparados à utilização de rufiões, levando em consideração os custos associados à cirurgia, os riscos de cópula bem-sucedida e a manutenção de um ou mais touros na propriedade.
5. Colostragem
De nada adianta aprimorar a genética do rebanho e empregar ferramentas para aumentar a concepção, resultando no aumento do número de animais de alto valor zootécnico, se esses animais, quando ainda bezerras, enfrentarem desafios ambientais e imunológicos significativos, podendo, eventualmente, chegar à morte.
Infelizmente, a sanidade das bezerras figura entre os principais desafios em grande parte das fazendas leiteiras do país. Condições climáticas adversas, instalações precárias, o uso indiscriminado de antibióticos e antiparasitários, e, especialmente, uma colostragem ineficiente aliada a uma inadequada cura do umbigo criam um cenário propício para inúmeros prejuízos.
Esses prejuízos não se limitam apenas à perda do animal, há também um impacto negativo no desenvolvimento geral das bezerras. Aquelas que são afetadas por doenças agudas ou crônicas experimentam um menor ganho de peso, resultando em atrasos no primeiro cio, o que, por sua vez, culmina em uma produção menos rentável ao longo de sua vida produtiva.
Fonte: Anne van der Woude (2022)
Para atenuar esses problemas, é crucial iniciar o controle pelo principal fator que afeta a saúde dos bovinos jovens: a colostragem. Devido às características da placenta bovina, todos os anticorpos necessários são transferidos por meio do colostro nas primeiras mamadas após o nascimento. Quando os animais recebem um colostro de qualidade inferior, demoram para ingerir ou recebem quantidades insuficientes, isso resulta em uma condição de imunossupressão nos animais.
Para evitar isso, dois pontos são fundamentais, o primeiro é a colostragem de 10 a 15% do peso vivo do animal, nas primeiras 8 horas de vida, essa colostragem pode seguir a seguinte indicação:
- 10% do peso vivo do bezerro nas primeiras 6 horas de vida
- 5% do peso vivo do bezerro até completar 8 horas de vida
Essa urgência no fornecimento do colostro, se deve a absorção eficiente das imunoglobulinas nas primeiras horas de vida. Com o passar do tempo, ocorre uma queda acentuada na absorção, comprometendo assim a imunidade passiva.
O outro ponto, é a qualidade do colostro, a qual desempenha um papel crucial na sobrevivência do animal, uma vez que a concentração de imunoglobulinas influencia diretamente na capacidade de defesa imunológica do bezerro. É por isso que a utilização de ferramentas como colostrometros ou refratômetros para uma classificação adequada do colostro é essencial.
Além disso, a criação de um banco de colostro, com a devida classificação de sua qualidade, permite o fornecimento imediato aos recém-nascidos, podendo ser a chave para assegurar um início de vida saudável para os animais.
6. Vacinação e controle de parasitos
A vacinação, sem dúvida, é uma das ferramentas de melhor custo-benefício para preservar a sanidade do rebanho. Doenças como brucelose, raiva e clostridioses são endêmicas em várias regiões do país, resultando em perdas econômicas significativas, seja pela morte dos animais, queda nos índices reprodutivos e de produção, ou pelo abate sistemático dos animais contaminados.
Nesse contexto, deter de um programa sanitário com vacinações adequadas e bem planejadas emerge como a melhor estratégia para mitigar os riscos de um rebanho doente, a um custo muito baixo de dose por animal.
Outra estratégia fundamental é o controle de endo e ectoparasitas no rebanho. O complexo de tristezas parasitárias, como babesiose e anaplasmose, e a ação de endoparasitas gastrintestinais e pulmonares não apenas podem resultar eventualmente na morte dos animais, mas também provocam uma depressão contínua na vitalidade das vacas de leite. Isso leva a reduções drásticas na produção desses animais, principalmente pelo caráter silencioso dessas afecções.
Fonte: MidDay (2022)
Diversos métodos podem ser empregados para o controle de parasitas. Entre eles, destaca-se a combinação do controle de larvas nas pastagens, por meio de práticas como a rotação de pastagem, aliada à vermifugação de todos os animais em todas as categorias do ciclo de vida, além da aplicação de carrapaticidas.
Quando essas ações são combinadas e empregadas de maneira consciente, com orientação adequada, tornam-se elementos crucialmente importantes para a saúde do rebanho.
7. Divisão de lotes e nutrição
A divisão do rebanho em lotes é uma prática comum na produção leiteira. No entanto, nem sempre é realizada de maneira apropriada ou com critérios bem definidos. Essa divisão é crucial não apenas para permitir formação de lotes homogêneos e reduzir a densidade de animais por área, mas também para fornecer nutrição adequada aos animais em diferentes fases da lactação, atendendo às suas respectivas exigências.
Essa divisão pode ser orientada por critérios que dependem do tamanho do rebanho, do espaço disponível para separação e do tipo de criação na propriedade. Para isso, é essencial classificar os animais de acordo com o estágio fisiológico em que se encontram, contemplando as seguintes fases:
- Pós-parto e início da lactação;
- Terço médio da lactação;
- Final da lactação;
- Secagem;
- Pré-parto.
A divisão é crucial porque cada fase apresenta exigências nutricionais específicas. Padronizar a mesma nutrição para todo o rebanho significa reduzir o potencial de produção para as vacas no início da lactação, que demandam maior aporte de energia e proteína para atingir o pico de lactação e passar pelo período de maior balanço energético negativo (NADIR). Além disso, uma nutrição desbalanceada pode levar a ganhos de peso excessivos nos animais em estágios finais de lactação e secagem, onde não há necessidade de aporte tão elevado de proteínas e energias.
Nesse contexto, a redução da carga energética nutricional para adaptar o animal à secagem é fundamental. Vacas que parem com Escore de Condição Corporal (ECC) muito elevado têm maiores chances de desenvolver afecções causadas por distúrbios metabólicos (hipocalcemia, cetose e deslocamento de abomaso) como também distocias ao parto, interferindo na reprodução e nas próximas lactações desses animais.
Outra separação importante baseia-se na ordem de parição, onde as primíparas, em fase de crescimento e com uma demanda nutricional maior para garantir desenvolvimento e produção de leite, devem ser colocadas em lotes separados ou em lotes com menor densidade de animais.
Devido ao tamanho desses animais e à hierarquia na qual os bovinos se organizam, as primíparas, por serem menores e mais jovens, podem encontrar resistência de outras em relação ao espaço no cocho para alimentação. Uma segunda estratégia envolve a separação dos animais de alta produção, que estão no auge da produção leiteira, exigindo uma nutrição equilibrada com elevados valores energéticos.
Uma maior segmentação entre os lotes, baseada nos critérios previamente mencionados, aprimora significativamente o potencial de ação e o planejamento para maximizar a produtividade do rebanho. Contudo, é crucial destacar que essa abordagem demanda um controle sistemático e a implementação de um programa de ações bem definido.
Figura 4: Novilhas de reposição com peso adequado para início para reprodução. Fonte: Agriculture Environment and Rural Affairs (AERA), 2022.
Dessa forma, o incremento na produção de leite e, consequentemente, na produtividade da fazenda, não depende apenas de investimentos expressivos, mas também de pequenas melhorias contínuas em áreas estratégicas. A soma dessas melhorias, ao longo do tempo, culmina em um impacto significativo nos resultados.
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