A criação de bezerras é uma fase importante e que requer grande atenção desde o nascimento até o desmame pois nela, visa-se maximizar o desempenho, uma vez que as bezerras representam a futura produção e reposição do rebanho da fazenda.
Se bem manejadas, as bezerras podem trazer retorno financeiro para a propriedade por apresentarem maiores produções no futuro.
O processo de pasteurização do leite de descarte antes de ser ofertado é capaz de melhorar a saúde e o desempenho das bezerras leiteiras, o que contribui para a eficiência e também a sustentabilidade da atividade.
Nesse texto, iremos discutir sobre a utilização do leite de descarte e o seu processo de pasteurização, evidenciando as formas de realização, a relação entre a pasteurização e o tempo de fornecimento e também a correção de sólidos totais do leite após esse processo.
Utilização de leite de descarte no aleitamento de bezerras leiteiras
Essa etapa da vida dos animais é caracterizada por custos mais elevados, especialmente durante a fase de aleitamento, devido à necessidade de garantir uma nutrição adequada e esses animais ainda não estão produzindo dentro da fazenda.
Uma alternativa que comumente vem sendo adotada por muitas fazendas leiteiras pensando na redução de custos é a utilização de leite de descarte para esses animais em aleitamento, o que entra na composição de custo como “custo zero”, visto que esse leite não poderia ser comercializado para geração de receita.
A utilização desse leite de descarte para alimentação das bezerras pode causar alguns riscos, como o de resistência a medicamentos, como os antimicrobianos presentes no leite de descarte de vacas em tratamentos de mastite por exemplo e também pela alta variabilidade no teor de sólidos totais, principalmente proteína, gordura, lactose e minerais que esse leite apresenta.
Além disso, o leite oriundo de vacas com mastite pode ser um transmissor de alguns microrganismos para a bezerra, como é o caso da Escherichia coli, Salmonella ou Mycoplasma, além de outros microrganismos que podem estar presentes no leite devido a má higienização dos tetos das vacas no momento da ordenha.
No entanto, como forma de reduzir os malefícios relacionados aos a transmissão de patógenos, temos a pasteurização do leite, a qual quando realizada adequadamente, é uma excelente estratégia para reduzir a carga de patógenos, como bactérias, vírus e protozoários, o que contribui para a redução da incidência de diarreias e pneumonias quando comparado com o leite de descarte não tratado.
A pasteurização pode ser realizada de duas formas:
- Pasteurização lenta: nesse tipo de pasteurização o leite é submetido a temperaturas entre 62 e 65 °C por 30 minutos e pode ser realizada utilizando equipamentos mais simples.
- Pasteurização rápida: o leite é submetido a temperaturas entre 72 e 75 °C por 15 a 20 segundos, o que otimiza tempo e energia, mas requer equipamentos de pasteurização de placas, ou seja, um equipamento mais sofisticado.
É importante ressaltarmos que a pasteurização do leite não será responsável por garantir um nível seguro de contaminação por microrganismos desse leite descarte.
Ou seja, o quanto as bezerras suportam de exposição aos patógenos está intimamente relacionado com a sua saúde geral, sua nutrição e também a presença de agentes estressantes no ambiente que elas estão alojadas.
O processo de pasteurização, embora consiga reduzir o número de microrganismos presentes no leite, quando temos um leite descarte antes da pasteurização com uma carga bacteriana extremamente alta, possivelmente esse leite pode ainda continuar tendo uma carga considerável de bactérias após o processo.
Além disso, é fundamental termos a consciência de que as toxinas que são produzidas por muitas bactérias e também o resíduo de antibiótico presente não irão ser destruídos após esse processo de pasteurização.
Outros fatores de extrema importância para o sucesso do processo de pasteurização é a condição do equipamento, o qual deve ser revisado periodicamente, a manutenção da higiene do pasteurizador e também a capacitação do operador do aparelho, a fim de que sejam evitados erros de manuseio, como tempo e/ou temperaturas inadequadas.
Imagens de um equipamento pasteurizador de uma fazenda leiteira. Fonte: Laryssa Mendonça
Pasteurização do leite descarte X tempo de fornecimento do leite
Estudos já demonstraram que o mesmo a pasteurização conseguindo reduzir a carga bacteriana, o tempo de fornecimento do leite após a pasteurização pode ser um fator determinante para garantir que as bezerras estejam ingerindo de fato um leite com menos contaminação.
Nesses trabalhos, foi possível observar que o número de amostras de leite consideradas adequadas é reduzido conforme o tempo entre a pasteurização e o fornecimento às bezerras aumenta, podendo em alguns casos termos leite até com maior carga bacteriana do que antes da pasteurização.
Contagem bacteriana total de coliformes (UFC/ml) no leite antes e após a pasteurização. Fonte: Adaptado de Heinrichs e Jones (2011).
Comparação da contagem bacteriana no leite de descarte antes da pasteurização, após a pasteurização e no momento de fornecimento. Fonte: Adaptado de Heinrichs e Jones (2011).
Isso vem nos dizer que a recontaminação do leite após o processo de pasteurização é possível e podemos dizer que é comum em muitas propriedades leiteiras.
A justificativa para isso está no fato de que o leite após ser pasteurizado não se torna estéril, ou seja, ainda há presença de microrganismos, aqueles que sobrevivem ao processo, os quais podem se multiplicar de maneira extremamente rápida no leite que não está refrigerado.
Correção do teor de sólidos totais do leite pasteurizado
Após a pasteurização, o teor de sólidos totais deve ser reajustado também, visto que o leite proveniente de vacas com mastite, com leite em transição ou de vacas com antibióticos possui alterações em sua composição. A correção do teor de sólidos do leite descarte é uma prática importante para garantir que as bezerras recebam uma alimentação balanceada.
Para que o teor de sólidos totais esteja entre 12,5 a 13%, podemos realizar a correção através da adição de sucedâneo de leite, que deve ser realizada quando o teor de sólidos estiver abaixo do desejado, podemos adicionar suplementos específicos, como é o caso do substituto de leite ou suplementos proteicos a fim de ajustar a composição do leite.
Outra opção poderia ser aumentar o volume de leite de descarte fornecido às bezerras.
Como podemos observar na tabela, os animais que receberam leite integral tiveram uma média de gordura semelhante aos que receberam leite de descarte. No entanto, ao comparar com os animais que receberam leite de descarte pasteurizado, a média foi de 13,95% menor, evidenciando a importância da suplementação e enriquecimento do leite com sucedâneo.
1. EPM: Erro padrão da média; 2- EST: Extrato seco total; 3- ESD: Extrato seco desengordurado; 4- CCS10: Contagem de células somáticas; 5- CBT: Contagem bacteriana total. a, b, c Médias seguidas por letra minúscula
Composição, contagem de células somáticas e contagem bacteriana total de amostras de leite integral, descarte e descarte pasteurizado. Fonte: Albuquerque et al. (2019)
Em contrapartida, ao analisar a CBT (Contagem Bacteriana Total), o leite de descarte pasteurizado apresentou uma média 1,530% maior em comparação com o leite integral, enquanto os animais que receberam leite de descarte tiveram um valor 3,480% maior.
Conclusão
Em resumo, ressaltamos que o leite pasteurizado, quando bem manuseado, é uma excelente escolha para diminuir a morbidade, a mortalidade e promover o ganho de peso das bezerras, sendo então uma medida importante para a saúde e bem-estar das bezerras.
Além disso, é importante lembrar que a escolha do tipo de leite ofertado para as bezerras dependerá muito do sistema da propriedade, da realidade do produtor, entre outros fatores, entretanto, o que é imprescindível é o manejo adequado de aleitamento dentro da realidade e estratégias particulares.
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