Você sabia que a primeira alimentação de uma bezerra recém-nascida pode definir sua saúde e desenvolvimento futuros?
Esse momento fundamental é conhecido como colostragem, onde a bezerra recebe o colostro, composto por uma combinação de secreções e elementos do soro sanguíneo, especialmente imunoglobulinas (Ig) e outras proteínas séricas, que se acumulam na glândula mamária durante o período seco anterior ao parto da vaca.
Esse processo inicia-se várias semanas antes do nascimento, sob a influência de hormônios lactogênicos como a prolactina.
O fornecimento de uma segunda colostragem de maneira adequada para as bezerras recém-nascidas está intimamente ligado à promoção de mais saúde e melhor desempenho desses animais, o que é demonstrado pelos seus efeitos a longo prazo na morbidade, mortalidade e no desenvolvimento.
Nesse texto iremos discutir melhor sobre o manejo da segunda colostragem, evidenciando os seus principais benefícios na vida desses animais.
Fornecimento do colostro
Componentes essenciais do colostro incluem imunoglobulinas, leucócitos, fatores de crescimento, hormônios, agentes antimicrobianos inespecíficos e nutrientes.
Porém, as concentrações de muitos desses elementos são mais altas nas primeiras secreções coletadas após o parto (primeiro colostro de ordenha), diminuindo gradualmente ao longo das próximas seis ordenhas (leite de transição) até alcançarem os níveis mais baixos tipicamente encontrados no leite integral comercializado.
Os ruminantes recém-nascidos dependem do consumo de colostro para adquirir anticorpos circulantes nas primeiras semanas de vida, essenciais para combater patógenos até que seu sistema imunológico possa produzir os seus próprios.
Essa dependência se deve ao tipo de placenta dos ruminantes que impede a transferência de imunidade durante a gestação. Além de fornecer anticorpos, o colostro possui alto valor nutricional, com presença de compostos bioativos importantes no desenvolvimento e maturação do trato gastrointestinal.
Pesquisas sobre as funções do colostro para recém-nascidos vêm sendo realizadas há muitas décadas. Uma antiga recomendação era de fornecer 2 litros de colostro ao nascer e mais 2 litros na próxima refeição ou 12 horas após o nascimento.
Entretanto, essa orientação mudou com a publicação de novas pesquisas e a recomendação mais atual passou a ser o fornecimento de colostro em função do peso ao nascer, dentro das primeiras 2 horas de vida na primeira colostragem. Essa abordagem praticamente dobrou o volume de colostro na primeira refeição, aumentando a absorção de anticorpos e beneficiando a saúde dos animais.
Embora o intestino dos bezerros ainda permita a absorção de IgG até 12 horas após o nascimento, estudos mostram que a transferência de imunidade passiva pode ser melhorada com uma segunda alimentação de colostro.
Em resumo, temos a seguinte recomendação do manejo de primeira e segunda colostragem:
- Primeira colostragem: Fornecimento de 10% do Peso Vivo (PV) em até 2 horas após o nascimento.
- Segunda colostragem: Fornecimento de pelo menos 5% do PV em até 6-8 horas após o nascimento.
Exemplo de um cronograma de primeira e segunda colostragem de uma bezerra nascida com 40kg. Fonte: Padrão Ouro de Criação de Bezerra
Produção de colostro
Pesquisas indicam que vacas mais velhas geralmente produzem colostro de melhor qualidade, provavelmente devido à sua maior exposição a patógenos ao longo do tempo.
Vacinar vacas e novilhas prenhes nas últimas 3 a 6 semanas antes do parto tem demonstrado aumentar os níveis de anticorpos específicos no colostro, resultando em títulos mais elevados de anticorpos passivos nos bezerros.
Em contrapartida, vacas com períodos secos muito curtos, de menos de 21 dias, produzem colostro com menores concentrações de IgG e em quantidades reduzidas. Um estudo revelou que vacas com um período seco de 40 dias produziram 2,2 kg a menos de colostro do que aquelas com um período seco de 60 dias.
O refratômetro Brix, que mede a porcentagem de sólidos em uma solução, tem se mostrado eficaz para estimar indiretamente os níveis de IgG no colostro, sendo menos influenciado pela temperatura e mais resistente que o colostrômetro de vidro.
Além disso, a absorção de imunoglobulinas pelo intestino dos recém-nascidos diminui gradualmente desde o nascimento até parar completamente após cerca de 24 horas, um processo conhecido como fechamento.
Como a segunda colostragem impacta na vida da bezerra?
Fornecer colostro apenas na primeira refeição, pode limitar o consumo de anticorpos.
Estudos mostram que fornecer mais refeições de colostro pode aumentar as concentrações séricas de anticorpos, e promover alguns benefícios as bezerras, como:
- Melhor saúde.
- Reduzir a morbidade.
- Melhoria do desempenho das bezerras.
A segunda alimentação de colostro diminui a falha na transferência de imunidade passiva e reduz a incidência de doenças respiratórias e diarreia, além de proporcionar maior ganho de peso.
Bezerras que receberam uma segunda refeição também apresentaram redução na idade ao primeiro parto e maior produção de leite na primeira lactação. Embora a prática de fornecer colostro adicional exige uma logística mais complexa, os benefícios consistentes justificam o investimento.
Recomendações recentes enfatizam a importância da segunda refeição de colostro para a saúde dos animais pois colostro com alta qualidade imunológica e microbiológica somado a utensílios limpos e higienizados irão contribuir para o sucesso do manejo.
Produtores que já adotaram essa prática em suas propriedades relataram melhorias significativas no desenvolvimento dos animais, principalmente por adoecerem menos, e na eficiência da criação das bezerras, resultando em maior rentabilidade do rebanho.
Uma pesquisa demonstrou que bezerros que receberam uma segunda refeição de 2 litros de colostro tiveram uma redução de quatro vezes nas chances de falha na transferência de imunidade passiva em comparação com aqueles que receberam apenas uma refeição inicial de 3 litros.
A segunda alimentação de colostro reduziu significativamente a incidência de algumas doenças, como a diarreia antes do período de desmame, o que afirma a melhoria da saúde desses animais. Bezerros que receberam a segunda refeição também apresentaram um início tardio de doenças, sugerindo um efeito prolongado da imunidade passiva.
Curva de sobrevivência de Kaplan- Meier da probabilidade de não doença de bezerros dependentes do número de refeições de colostro recebidas nas primeiras 24 horas de vida para (a) doença respiratória, (b) diarreia, (c) qualquer doença pré-desmame. Fonte: Abuelo et. al (2021)
O manejo adequado do colostro é importante para garantir a saúde e a sobrevivência das bezerras e tem um impacto significativo no custo da propriedade.
Além disso, o sucesso nesse manejo é responsável por aumentar o tamanho, largura e o número de vilosidades intestinais, profundidade das criptas e também a espessura da mucosa.
Hoje sempre há possibilidades de melhoria nas práticas de manejo de colostro. Essa contribuição para o desenvolvimento intestinal é extremamente importante, pois determina às bezerras recém nascidas a possibilidade de estabelecer mecanismos fundamentais de defesa imunológica.
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Autoras: Debora Avelar e Laryssa Mendonça – Equipe Leite Rehagro
Referências
- Abuelo, A., Cullens, F., Hanes, A., Brewster, J.L. 2021. Impact of 2 Versus 1
- Colostrum Meals on Failure of Transfer of Passive Immunity, Pre-Weaning Morbidity and Mortality, and Performance of Dairy Calves in a Large Dairy Herd. Animals 11: 782; https://doi.org/10.3390/ani11030782.
- Godden, S. 2008. Colostrum management for dairy calves. Vet. Clin. North Am. Food Anim. Pract. 24:19–39. doi: 10.1016/j.cvfa.2007.10.005
- Lombard, J., Urie, N., Garry, F., Godden, S., Quigley, J., Earleywine, T., McGuirk, S., Moore, D., Branan, M., Chamorro, M., Smith, G., Shivley, C., Catherman, D., Haines, D., Heinrichs, A., James, R., Maas, J., & Sterner, K. 2020. Consensus recommendations on calf- and herd-level passive immunity in dairy calves in the
- United States. Journal of Dairy Science, 103(8), 7611-7624. https://doi.org/10.3168/jds.2019-17955.
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