De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 60% das infecções humanas são causadas por vírus, bactérias ou parasitas que têm origem em animais. São as chamadas zoonoses, enfermidades geradas por patógenos oriundos de animais que, em algum momento, são capazes de “pular” de uma espécie para outra. Existem mais de 200 tipos de doenças consideradas como zoonoses, entre as quais a AIDS, causada pelo vírus HIV, o vírus Ebola e a gripe.
Muitos desses agentes ainda são desconhecidos pela ciência, e sua exposição a populações sem anticorpos pode gerar graves problemas de saúde pública. Conforme dados da OMS, de um total de 30 novos patógenos humanos emergentes nas últimas três décadas, 75% eram provenientes de animais.
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A Covid-19, que se estima ter surgido de animais silvestres, é o exemplo mais recente do perigo potencial que as zoonoses representam e da escala que podem alcançar, desde pequenos surtos até pandemias potencialmente letais.
Transmissão e contágio
A transmissão das zoonoses acontece por contato direto com os animais e suas secreções e excretas, tanto por arranhaduras, mordeduras, contato com feridas, como pela manipulação de carcaças. O contágio também pode ser indireto, por meio de vetores (mosquitos e pulgas), água ou alimentos contaminados.
Entre as populações mais vulneráveis às zoonoses estão aquelas que vivem em zona rural ou zona de mata e agricultores, devido à maior probabilidade de contato direto ou indireto com animais silvestres. “Não temos ideia do número de agentes potencialmente patogênicos aos humanos presentes em uma floresta ou área de mata virgem”, destaca a pesquisadora científica Viviane Botosso, do Laboratório de Virologia do Instituto Butantan, órgão vinculado à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.
A expansão causada pela urbanização e pelo desmatamento também favorece a emergência de patógenos não documentados, graças à destruição de habitats naturais e maior contato dos humanos com animais silvestres.
Outro fator de contaminação é a manipulação de carnes, subprodutos de animais silvestres ou de animais de criação de subsistência, sem controle sanitário adequado. O sarampo, por exemplo, embora hoje seja uma doença restrita aos seres humanos, acredita-se que tenha surgido há milhares de anos a partir da peste bovina, que está atrelada à criação de gado e contato direto dos criadores com secreções e excretas dos animais.
“O problema também está no mercado de animais vivos. Geralmente, o cozimento das carnes inativa os agentes infecciosos, no entanto, o manuseio desses animais, o contato direto com sangue, secreções e vísceras sem o cuidado adequado, pode contaminar comerciantes e compradores muito facilmente”, diz a pesquisadora.
O alerta também se estende aos animais domésticos. “Cães e gatos também podem transmitir zoonoses, mas há uma supervisão maior, já que estão em ambientes controlados”, alerta Viviane. Em São Paulo, a Divisão de Vigilância de Zoonoses, órgão da Secretaria de Estado da Saúde, é a responsável por promover campanhas anuais de vacinação gratuita contra as principais doenças que podem ser transmitidas por cães e gatos domésticos.
Entre os principais exemplos de zoonoses estão a raiva, a leishmaniose visceral canina (LVC), a febre maculosa, a toxoplasmose e a leptospirose. Para mais informações, o Ministério da Saúde disponibiliza um Manual de Vigilância, Prevenção e Controle de Zoonoses.
O que fazer ao entrar em contato com animais silvestres
A prevenção contra zoonoses acontece tanto em nível pessoal quanto comunitário, e deve estar alinhada à situação epidemiológica de cada região, que é acompanhada pelos sistemas locais de vigilância. São essas estruturas que geralmente promovem medidas preventivas, como campanhas de vacinação temporárias ou permanentes. Vale lembrar que os patógenos requerem cuidados específicos, então o ideal é estar sempre atento às diretrizes de manejo ambiental e vacinação animal.
“A primeira coisa a fazer quando achar um animal silvestre é não matar. Todos os animais têm uma função no ecossistema e matá-lo pode causar um distúrbio”, alerta Viviane. Ela reforça que o essencial é não entrar em contato e nem se aproximar do animal, mas acionar os órgãos de vigilância em zoonoses da região. Em caso de ferimento acidental, a recomendação é procurar o serviço médico mais próximo imediatamente.
Caso o animal esteja morto, outra medida possível é o envio do bicho para o serviço especializado da região, de modo que se consiga determinar áreas de risco epidemiológico ou monitorar a circulação viral, por exemplo. É recomendado que o manuseio desses animais seja feito por especialistas e com equipamento de proteção (uso de luvas e sacos plásticos).
A limpeza após o contato com animais desconhecidos é também um fator importante. “Entrou um macaco na sua casa, por exemplo, e não saiu? Não tente machucar o animal ou tirá-lo sozinho. Procure autoridades competentes, como o serviço de zoonoses ou até mesmo os bombeiros. Se o animal mexer em algum alimento, jogue fora. Limpe toda a área por onde o animal passar. São cuidados que precisamos ter”, reforça a pesquisadora.
FOTOS: Shutterstock
(Com Butantan)