No cenário atual da pecuária leiteira, é fundamental que seja conhecida as exigências nutricionais dos animais jovens para que as mesmas possam então ser sejam atendidas. Isso se torna fundamental para o bem-estar, desenvolvimento e eficiência.
Dentre as razões pelas quais se faz importante esse conhecimento, podemos citar o desempenho e crescimento adequado, a produção de leite futura, saúde, eficiência reprodutiva e a economia e eficiência produtiva.
Nesse texto iremos discutir sobre as exigências nutricionais das bezerras leiteiras e das novilhas, ou seja, trazendo recomendações desde a fase inicial da vida da bezerra até o parto da novilha.
Bezerras leiteiras
A saúde e o crescimento das bezerras dependem de fatores que interferem antes, durante e no período imediatamente após o parto. A criação de bezerras, principalmente do nascimento ao desaleitamento, representa o principal período de atenção e exige boas práticas de manejo e muita atenção a detalhes.
O colostro, que é o primeiro leite produzido pela vaca recém parida, é o primeiro e mais importante alimento que a bezerra recém-nascida necessita de ingerir. Ao nascer as bezerras não possuem proteção conta possíveis doenças, em razão dos anticorpos do sangue da mãe não cruzarem a barreira transplacentária.
Além de conferir imunidade as bezerras, o colostro fornecem nutrientes em razão de sua alta porcentagem de proteína e gordura (Tabela 1). As concentrações de minerais e vitaminas também são maiores, garantindo estoques adequados até que se estabeleça um consumo adequado de alimentos sólidos.
De acordo os com estudos, o corpo do animal recém-nascido possui poucas reservas de gordura, e a maior parte dos lipídeos é de origem estrutural e não pode ser mobilizada.
As reservas de gordura corporal e glicogênio que podem ser mobilizadas se esgotam em 18 horas após o nascimento se os animais não forem alimentados, o que demonstra a importância da administração imediata de colostro aos animais.
Fonte: Adaptado de Roy (1970) e Foley e Otterby (1978)
A quantidade de colostro a ser fornecida irá depender do peso corporal, devendo ser administrado um volume de 10% do peso corporal na primeira mamada em até 2 horas após o parto e a segunda colostragem um volume de 5% do peso corporal de 6 a 8 horas após a primeira.
Um dos aspectos críticos na nutrição dos bezerros é o fornecimento da dieta líquida e o desenvolvimento do rúmen. Nos primeiros 3 a 5 dias de vida, a bezerra deve receber o leite de transição, o qual é descrito como o período entre a segunda até a sexta ordenha pós-parto, pois há um declínio gradual dos componentes nutricionais e bioativos após a primeira ordenha.
O leite de transição possui grande importância para a saúde das bezerras por apresentar um perfil nutricional e imunológico superior ao leite integral (Tabela 2), apresentando concentrações consideráveis de gordura, proteínas, aminoácidos e compostos bioativos, como os fatores de crescimento semelhante a insulina (IGF-I e IGF-II), insulina, lactoferrina, lisozima e lactoperoxidase.
Os componentes bioativos e nutricionais presente no leite de transição podem beneficiar a saúde e o crescimento geral dos bezerros, pois o aumento no desenvolvimento do trato digestivo, particularmente o intestino delgado, permite uma melhor absorção de nutrientes e de outras moléculas bioativas.
Além disso, permitem aumento no desenvolvimento do intestino delgado e uma melhora subsequente na absorção de glicose, que permitem que os bezerros superem a hipoglicemia e o balanço energético negativo, que é comum em bezerros recém-nascidos.
As imunoglobulinas presentes nesse leite, também desempenham papel importante, mesmo não sendo absorvidas devido ao fechamento dos enterócitos do intestino, auxiliam no impedimento de infecções causadas por vírus e bactérias local.
Tabela 2. Perfil nutricional do leite conforme as ordenhas pós-parto. Fonte: Adaptado de Blum e Hammon, 2000
Trato Gastrointestinal, dieta líquida e sólida
Na fase inicial de vida da bezerra o compartimento reticulo-rúmen ainda não está desenvolvido, tornando o abomaso o compartimento funcional para digestão, sendo dependente de enzimas digestivas.
A partir de um reflexo condicionado pelo estimulo da mamada, ocorre a contração dos tecidos formando a goteira esofágica direcionando o leite diretamente da base do esôfago ao orifício retículo-omasal e ao abomaso. A ativação do reflexo da goteira esofágica é importante para evitar a entrada e a fermentação de leite no rúmen.
Fluxo casual do leite, demonstrando a goteira esofágica e o leite sendo direcionado para o abomaso. Fonte: Agros
As recomendações de alimentação para dietas liquidas são de 10 a 12% do peso corporal da bezerra com leite ou sucedâneo. Estima-se que, para atender o sistema imune, o animal apresente aumento de exigência nutricional de 20 a 40% da mantença, e que, na ausência de quantidades adequadas de energia e proteína, a imunidade celular, a produção de citocinas, o sistema complemento, a função fagocitária e as concentrações de anticorpos são diminuídos.
O primeiro alimento seco que uma bezerra consome deve ser uma ração inicial que contém cereais e suplementos proteicos projetados para desenvolver o rúmen da bezerra e fornecer uma fonte de nutrientes economicamente viável.
O objetivo é desmamar as bezerras para redução dos custos com a alimentação, reduzir riscos de distúrbios digestivos e desenvolver o rúmen. Quando a bezerra estiver consumindo em torno de 1kg ou mais de ração inicial por dia, poderá ser desmamada.
Recomenda-se uma ração completa, contendo fibras, quando forragem não é disponibilizada, para ocorrer o desenvolvimento das papilas ruminais e da musculatura do rúmen.
Um nutriente que se deve atentar na nutrição de bezerras é a proteína. Este componente da ração que deve estar entre 20 a 22% de proteína bruta para manter o crescimento após desmama.
Um bom concentrado para bezerros deve:
- Ser palatável;
- Ter níveis adequados de proteína 20% (sem ureia);
- Nível de energia de 80% de NDT;
- Valores de FDA 20% devem ser evitados;
- Valores de FDN utilizados de 15 a 25% (valores maiores podem ser utilizados quando a fonte de FDN vem de casca de soja, polpa de beterraba, caroço de algodão ou aveia);
- Deve ser constituído de alimentos de boa qualidade, como milho, farelo de soja, farelo de algodão, leite em pó etc;
- Deve ter textura grosseira e deve ainda apresentar níveis de vitaminas e minerais recomendados pelo NRC.
A nutrição na fase inicial da vida dos bezerros pode trazer efeitos a longo prazo na vida do animal, como melhora do desenvolvimento e funcionamento do sistema imunológico, aumento precoce do desenvolvimento mamário, alteração do funcionamento e desenvolvimento endócrino, maior deposição de tecidos magros e maior produção futura de leite.
As bezerras devem ter acesso a água para garantir a ingestão adequada de líquido, evitar desidratação e para estimular a ingestão de matéria seca da ração. A água deve ser fresca, limpa e oferecida desde o primeiro dia de vida.
Estudos demonstram que para um bom desempenho dos animais, as bezerras durante os primeiros 30 dias de vida devem duplicar o seu peso em relação ao peso de nascimento.
Contudo, após esta fase, deve-se atentar ao ganho de peso dos animais para que este não ultrapasse 1kg por dia visto que isso pode aumentar a deposição de gordura na gandula mamária reduzido a produção leiteira futura.
Novilhas leiteiras
Durante a fase de crescimento após o desaleitamento, a maioria dos problemas sanitários dos animais termina. Sendo assim, é necessário decidir a taxa ideal de crescimento e ganho de peso, além de organizar a melhor e mais econômica fonte alimentar de energia, proteínas, minerais e vitaminas.
Esta categoria de animais, pode representar até 20% do custo de produção de leite. A principal estratégia para reduzir este custo é por meio da redução da idade ao primeiro parto, porém não deixando de avaliar os parâmetros de peso a primeira inseminação e peso ao primeiro parto junto deste número.
A criação de novilhas de reposição permite que o produtor maximize o ganho genético dentro do seu rebanho, substitua vacas de baixa produção, expanda o rebanho sem necessidade de compra de outros animais e possibilite ganhos econômicos com a venda de animais excedentes.
Ao se comparar as vacas de produção e bezerras em crescimento, as novilhas são fáceis de serem alimentadas, porém a dieta destes animais não deve ser negligenciada, uma vez que é responsável por uma significativa porcentagem do consumo de alimento da fazenda.
A primeira consideração em qualquer programa de alimentação de bovinos de leite é determinar as necessidades corporais de mantença, crescimento, gestação ou reprodução e produção de leite.
Imagem de animais de recria de uma fazenda leiteira. Fonte: João Paulo Pereira
Para novilhas em recria, as exigências diárias em energia, proteína e minerais/vitaminas são baseadas nas determinações de mantença e ganho de peso.
À medida que o peso vivo do animal se eleva, ocorrem mudanças nas composições corporais, tanto para proteínas, quanto para gorduras e minerais. A dieta deve ser diferenciada para cada uma das fases, haja vista que os requerimentos nutricionais se alteram de acordo com a proximidade da maturidade sexual.
Adaptado: NRC – Bovinos Leiteiros (2001)
Os requerimentos nutricionais para a fase de crescimento variam de acordo com o desempenho esperado, genética e o ambiente de criação influenciam significativamente nessas recomendações.
O ritmo de Ganho de Peso Diário (GDP) a ser praticado nos diferentes lotes em crescimento deve ser orientado para que os animais alcancem os padrões definidos pelas raças nas diferentes idades. Tanto a subalimentação como a superalimentação dos animais em crescimento são prejudiciais, pois animais subalimentados tem atraso na idade de liberação para reprodução e consequentemente a idade ao primeiro parto e os superalimentados terão potencializada a ocorrência de problemas relativos ao primeiro parto, menor taxa de concepção e deposição exagerada de gordura no úbere, ocasionando na redução proporcional de tecido mamário.
Imagem demonstrando um gráfico relacionando a taxa de crescimento de novilhas e a performance reprodutiva. Fonte: Adaptado de Michel A. Wattiaux
Inclusão de dietas de alta energia com ingestão marginal de proteínas produzem novilhas com alto escores de condição corporal (ECC), com menor desenvolvimento da glândula mamária e menor produção de leite.
Um momento crítico é a fase de desenvolvimento pré-púbere, de 4 a 10 meses de idade, quando a glândula mamária, os ductos secretores e as células do parênquima mamário se desenvolvem. Quando os níveis de nutrientes estão adequados e os escores de condição corporal estão dentro de faixas aceitáveis, o desenvolvimento mamário não será comprometido.
De maneira geral, novilhas pré-púberes são alimentadas com dietas de 40 a 80% de alimentos volumosos. À medida que o animal cresce, a concentração energética e proteica da dieta diminui, enquanto a concentração da fração fibrosa (FDN e FDA) aumenta. Novilhas com mais de 13 meses de idade já possuem suficiente capacidade retículo ruminal para o aumento da inclusão de alimentos volumosos com alta FDN sem prejudicar a taxa de crescimento.
ECC e maturidade sexual das novilhas
O ECC deve permanecer abaixo de 3 até que as novilhas sejam inseminadas. Estudos demonstraram que a maturidade sexual de novilhas se apoia mais no peso corporal que na idade e pode ser manipulada pelo programa nutricional. Quando atingirem o tamanho adequado, devem ser inseminadas, pois a gestação é um período fixo que pode atrasar o retorno do investimento.
Após o parto, os animais devem possuir ECC de 3 a 3,25, que representa cerca de 85% do peso corporal adulto do rebanho. Essa avaliação de ECC e do ganho de peso dos animais nessa fase é importante, pois estudos já demonstraram que um ganho de peso elevado, ou seja, 45kg de peso e/ou 5 centímetros durante a primeira lactação pode contribuir para uma redução na produção de elite em 272kg.
Além disso, na medida que as novilhas ficam mais velhas, principalmente acima de 12 meses, há susceptibilidade de se ter escores de condição corporal acima de 3,25, elevando assim os riscos de problemas durante o período de transição. No período final da gestação, além de permitir um ganho de 0,68 a 0,73 kg de estrutura corporal verdadeira, a nutrição desses animais deve fornecer nutrientes que garantam a nutrição do feto em crescimento, o desenvolvimento da glândula mamária e a síntese de colostro.
Durante o último trimestre de gestação, os ganhos de tecido fetal e adjacentes são responsáveis por 0,45 a 0,68 kg por dia de ganho de peso. Assim, a novilha próxima do parto deve ganhar na balança mais de 1,15 kg de peso por dia. Essas novilhas também precisam de microminerais e vitaminas adicionais para o feto em desenvolvimento, síntese de colostro, sistema imunológico e para minimizar distúrbios metabólicos.
Considerações finais
Em suma, a atenção cuidadosa às exigências nutricionais do gado jovem, particularmente das bezerras leiteiras e novilhas, é essencial para garantir não apenas o crescimento saudável, mas também o desempenho futuro do rebanho. Desde o momento crítico do nascimento, onde o colostro desempenha um papel crucial na imunidade e nutrição, até a transição para dietas líquidas e sólidas, cada fase demanda estratégias específicas. O equilíbrio adequado de proteínas, gorduras, vitaminas e minerais, especialmente durante a fase inicial, não só impacta o desenvolvimento físico, mas também fortalece o sistema imunológico.
A atenção à transição para a dieta seca, visando o desenvolvimento do rúmen. É crucial, a escolha cuidadosa de alimentos e nutrientes, como proteínas, que são essenciais para o sucesso da criação. Além disso, a fase de novilhas, que representa uma parcela significativa dos custos de produção de leite, destaca a importância de uma alimentação adequada para evitar problemas de reprodução e garantir um retorno econômico eficiente.
A gestão nutricional não se limita apenas ao crescimento, mas também influencia a longo prazo, afetando o desenvolvimento mamário, a produção de leite e a saúde reprodutiva. O manejo criterioso das novilhas, incluindo a gestão do escore de condição corporal, impacta não apenas a maturidade sexual, mas também a produção futura.
Em resumo, investir na nutrição adequada desde as fases iniciais até a maturidade é essencial para assegurar a saúde, produtividade e sustentabilidade do rebanho leiteiro.
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