Recuperação judicial para o produtor rural: Veja em que casos se aplica
Mariana Rezende – 27 de fevereiro de 2024
Recuperação judicial: A inclusão dos produtores rurais na Nova Lei de Recuperação Judicial e Falência trouxe mais segurança jurídica para o setor
O agronegócio é um setor muito importante para a economia nacional, mas, como todo segmento da economia, o produtor rural também está sujeito a passar por crises econômicas e financeiras.
Essas questões podem levar o produtor rural à necessidade de realizar a renegociação das dívidas, e solicitando a abertura da recuperação judicial junto aos credores.
A recuperação judicial do produtor rural tem passado por mudanças significativas ao longo dos últimos anos.
Sancionada em 2021, a Nova Lei de Recuperação Judicial e Falência trouxe mudanças importantes e proporcionou mais segurança jurídica à atividade econômica do produtor rural e ao agronegócio.
Neste artigo vamos esclarecer alguns pontos sobre a recuperação judicial do produtor rural. Boa leitura!
A recuperação judicial é o instituto aplicável a empresas que estejam em situação de crise econômico-financeira. Contudo, essa crise tem viabilidade econômica de ser revertida em curto ou médio prazo por meio da repactuação dos compromissos.
Assim, a recuperação visa garantir o restabelecimento da empresa no mercado, evitando a falência, na medida em que a atividade empresarial garante os interesses da sociedade, uma vez que é fonte produtora, gera empregos e resguarda os interesses dos credores.
A Lei nº 11.101/2005 estabelece as regras para solicitar a recuperação judicial pelas empresas e sociedades empresárias.
O artigo 48 da referida Lei estabelece que poderá requerer a recuperação judicial o empresário devedor que, no momento do pedido:
- Exerça regularmente suas atividades há mais de dois anos;
- Não seja falido; e, se foi, que estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado;
- Não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial;
- Não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial;
- Não ter sido condenado ou não ter, como ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos na lei de recuperação e falência.
O que é recuperação judicial para produtor rural
A Lei nº 14.112/2020 trouxe a possibilidade do produtor rural pessoa física de requerer um plano de recuperação judicial similar àquele destinado aos microempresários individuais.
Esta alteração na lei trouxe mais segurança ao inserir regras claras em relação ao pedido de recuperação judicial para produtores rurais em crise nos negócios.
Antes da Nova Lei de Recuperação Judicial, apenas empresas rurais legalmente constituídas como tal eram reconhecidas pela Justiça como detentoras do direito de pedir recuperação judicial.
Ou seja, apenas produtores rurais inscritos na Junta Comercial podiam requerer a recuperação judicial.
Após a aprovação da Lei, os produtores rurais que desenvolvem sua atividade como pessoa física também podem, com determinadas condições, se tornar pessoa jurídica para pleitear a recuperação judicial.
Dessa forma, não é mais necessário o registro perante a Junta Comercial para entrar com pedido de recuperação judicial, bastando apenas que ele comprove o exercício da sua atividade rural por pelo menos dois anos.
Como funciona a recuperação judicial para produtor rural
O artigo 48 da referida Lei institui que poderá requerer a recuperação judicial o produtor rural que exerça regularmente suas atividades há mais de dois anos e que atenda aos requisitos:
- No caso da atividade rural por pessoa jurídica, admite-se a comprovação do prazo de 2 anos por meio da Escrituração Contábil Fiscal (ECF), ou por meio da obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir a ECF;
- Para comprovação do prazo de 2 anos, o cálculo do período de exercício de atividade rural por pessoa física é feito com base no Livro Caixa Digital do Produtor Rural (LCDPR), ou por meio de obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir o LCDPR, e pela Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (DIRPF) e balanço patrimonial.
Além disso, a Lei determina que estarão sujeitos à recuperação judicial os créditos que decorram exclusivamente da atividade rural e estejam discriminados nos documentos citados nos itens I e II.
Outra inovação trazida pela Lei é a possibilidade de o produtor rural optar pelo procedimento simplificado, que era medida exclusiva para microempresas e empresas de pequeno porte, desde que o valor da dívida sujeita à recuperação judicial não exceda R$ 4,8 milhões.
Ademais, as dívidas referentes à aquisição de propriedades rurais de acordo com o repasse de recursos oficiais e fiscais não podem ser incluídas na recuperação. Também não poderão ser incluídas as dívidas amparadas em Cédula de Produtor Rural (CPR).
Divergências de entendimento da recuperação judicial do produtor rural
Apesar dos avanços para o produtor rural a partir da aprovação da Lei nº 14.112/2020, ainda existem incertezas sobre a recuperação judicial para esse público.
Uma divergência é de entendimento sobre a inclusão dos créditos constituídos antes do registro do produtor rural na Junta Comercial na recuperação judicial.
Esse tema ficou com uma lacuna aberta na Lei, e a interpretação jurídica predominante tem sido de que esses créditos também devem ser considerados na disputa entre os credores.
Outra controvérsia diz respeito ao fato de que, durante o período de suspensão das execuções, alguns credores, como os titulares de propriedade fiduciária de imóveis ou arrendadores mercantis, não estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial.
Assim, esses credores podem apreender ou alienar os bens do devedor, com exceção daqueles bens considerados como sendo bens de capital essenciais à sua atividade empresarial.
Por se tratar de produtores rurais, os tribunais possuem entendimento divergente se os produtos agrícolas, como soja e milho, devem ser considerados bens de capital para a atividade empresarial.
Dessa forma, portanto, não podem ser vendidos ou apreendidos durante o período de suspensão das execuções. Isto é, se esse conceito abarca apenas os imóveis, as máquinas e os utensílios necessários para a produção.
Conclusão
A possibilidade da Recuperação Judicial para o produtor rural foi um avanço na legislação brasileira. Os empresários do setor rural estão sujeitos aos mesmos problemas dos demais empresários.
Essa legislação foi capaz de demonstrar que houve um ganho social, traçando critérios objetivos para a concessão do benefício também para os produtores rurais pessoas físicas, resultando em maior segurança jurídica para o setor agrícola e para os credores.
Sou formada em economia e mestre em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Atualmente sou doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Economia e graduanda de Ciências Contábeis na mesma instituição.