No universo da produção leiteira, o manejo eficiente da cama no sistema de confinamento Compost Barn, como a frequência de aeração, deposição de dejetos e reposição de material, são pilares fundamentais para garantir o bem-estar e a saúde das vacas leiteiras.
A cama, composta por materiais como palha, maravalha, serragem, casca de amendoim, casca de café, palha de arroz, entre outros, desempenha um papel crucial na criação de um ambiente propício para o conforto dos animais, além de impactar diretamente na saúde dos animais.
O desempenho da cama do Compost Barn pode ser verificado por meio da análise da umidade da cama, a temperatura alcançada durante o processo, pH, relação carbono/nitrogênio, densidade e espaço livre de ar.
Nesse texto iremos discutir sobre manejos essenciais para garantir o sucesso do processo de compostagem e também do bem-estar dos animais. Traremos dicas sobre a umidade da cama, o controle de temperatura, a importância da reviragem periódica, bem como a reposição estratégica a fim de manter a qualidade da cama.
Umidade controlada para o bem-estar
Como um dos principais parâmetros que afetam o processo de biodegradação, temos o teor de umidade da cama. Ao controlar a umidade da cama, asseguramos um ambiente equilibrado para prevenir problemas de saúde, como a mastite ou doenças de casco, os quais impactam diretamente na produção de leite.
Gráfico demonstrando que o aumento da umidade da cama do Compost Barn elevou a incidência de casos de mastite ambiental.. Fonte: Favero et al. Livestock Science 181(2014) 220-230
Estudos já demonstram a susceptibilidade da cama do Compost Barn às condições ambientais que fica exposta, ou seja, observou-se que a umidade da cama aumenta à medida que a umidade relativa do ar também aumenta, o que evidencia a importância de estar atendo a períodos do ano que temos elevação dessa umidade.
Outro ponto importante de entendermos é que o aumento da umidade da cama irá promover uma maior agregação das partículas e também a redução da temperatura, ou seja, será favorecida a compactação e o sistema se torna anaeróbico.
Como controlar a umidade?
- Monitore regularmente a umidade da cama utilizando métodos adequados, sendo um deles podendo ser realizado de forma prática e rápida. Essa avaliação pode ser realizada pegando um punhado de cama na mão e comprimir, caso gotículas de água escorra, apareçam na superfície espremida ou se forme um bloco que não se desfaz facilmente, indica que a cama apresenta umidade elevada e pode ser considerado aumentar a ventilação mecânica no local, a qual auxilia na retirada da umidade superficial da cama ou que a reposição do material é necessária.
- Caso ao realizar a avaliação houver dificuldade de agregar as partículas pode sugerir que a cama está muito seca e com baixa fermentação, podendo ser indicado a inclusão de água na cama para umidificar.
- O ideal é que ao apertar se forme um bloco, entretanto, o mesmo é facilmente e rapidamente desfeito.
Ilustração do teste para avaliação da umidade da cama do Compost Barn, pegando uma amostra da cama, apertando na mão e tendo a formação de um bloco que rapidamente começa a ser desfeito, evidenciando uma umidade adequada da cama.. Fonte: Laryssa Mendonça
Uma outra maneira de verificar a adequação da cama envolve avaliar seu nível de umidade, realizando um cálculo direto da matéria seca por meio do uso de um forno de micro-ondas.
Mas como fazer isso?
- Em um recipiente adequado para uso em micro-ondas pese uma amostra homogênea do material da cama;
- O material deverá ser aquecido em ciclos de 3 minutos cada, onde ao final de cada ciclo o material deve ser retirado do micro-ondas e pesado;
- Ao atingir um peso que não é mais alterado por 3 ciclos e pesagens seguidas, significa que não existe mais umidade para ser perdida pelo material;
- Por fim, deve ser realizada a divisão do peso final encontrado pelo peso inicial da amostra, o resultado será o teor de matéria seca da cama.
Exemplo:
Peso inicial: 85g
- Ciclo 1 (3 minutos no micro-ondas): peso final 75g
- Ciclo 2 (3 minutos no micro-ondas): peso final 65g
- Ciclo 3 (3 minutos no micro-ondas): peso final 45g
- Ciclo 4 (3 minutos no micro-ondas): peso final 45g
- Ciclo 5 (3 minutos no micro-ondas): peso final 45g
Teor de matéria seca = peso final da amostra / peso inicial da amostra
Teor de matéria seca = 45 / 85
Teor de matéria seca = 52%
Ou seja, ao longo do processo, a amostra perdeu 48% de umidade, mostrando que o teor de matéria seca da cama está em 52%.
Mantenha a umidade entre 40% e 60%, e isso será resultado do equilíbrio entre a quantidade de dejetos, urina, atividade microbiana da cama.
Controle de Temperatura
Controlar a temperatura da cama de compost barn é essencial para proporcionar um ambiente adequado para as vacas. Uma cama na temperatura adequada influencia na secagem e sanitização da cama, além de reduzir a demanda de reposição, além dessa temperatura ser frequentemente usada para indicar o sucesso da compostagem.
O calor produzido no processo é resultado do processo metabólico dos microrganismos, e quando temos condições de superaquecimento, os organismos termófilos, aqueles que gostam de calor, são favorecidos e na condição oposta, ou seja, em um ambiente frio, o favorecimento passa a ser dos microrganismos que vivem e se reproduzem em baixas temperaturas, os psicrófilos.
A temperatura do ar pode ser considerada um preditor da temperatura da cama, ou seja, no inverno, quando o ar esfria, o gradiente de temperatura entre o ar e a cama se eleva, ocasionando uma maior perda de calor. Em contrapartida, no verão, esse gradiente de temperatura é reduzido pelo fato do calor perdido para o ambiente ser menor nesta estação do ano.
A que devo me atentar em relação à temperatura?
- Manter a temperatura entre 45 e 60ºC, medindo essa temperatura numa profundidade de 30cm. Nessa faixa de temperatura pode haver a eliminação de microrganismos patogênicos causadores de mastite.
- Temperaturas fora dessa margem trazem consequências para o bem-estar e para a saúde das vacas:
- Acima de 60ºC: reduz os patógenos, mas aumenta a frequência necessária de reposição, além de causar estresse térmico nos animais.
- Abaixo de 45ºC: a cama passará por um processo de semi-compostagem, tem-se maior dificuldade na secagem da cama, ineficiência na sanitização do ambiente.
A umidade e a reviragem da cama têm influência direta na temperatura dela. Por esse motivo, em caso de temperatura inadequada, verifique a necessidade de troca das camas e se os passos anteriores estão sendo seguidos adequadamente.
Reviragem periódica para homogeneidade
Revirar a cama é essencial para garantir uma distribuição uniforme da umidade e evitar pontos úmidos na cama. Como já sabemos, a cama muito úmida prejudica a saúde dos animais.
Quando a reviragem é realizada, promovemos a aeração, ou seja, uma maior entrada de oxigênio no material, o que além de ser benéfico pois eleva a atividade microbiana, irá favorecer a perda de umidade para o ambiente, melhorando assim a eficiência do processo de compostagem. Esse manejo visa promover que a camada mais seca vá para a superfície e a umidade superficial da cama seja incorporada às camadas mais profundas, além também da incorporação de fezes e urina.
É reconhecido que após algumas horas da reviragem da cama ocorre uma queda brusca do nível de oxigênio e a estabilização da temperatura, o que reafirma que para mantermos condições aeróbicas há a necessidade de realizar o revolvimento diário dessa cama.
Como realizar esse processo?
1. Realize a reviragem da cama pelo menos duas vezes por dia, aproveitando os momentos em que os animais estão na sala de ordenha.
Utilize ferramentas apropriadas para garantir uma mistura completa do material. Dentre essas ferramentas temos os escarificadores, que são os mais utilizados para essa função, podendo ser encontrados com ou sem o rolo destorrador, mas também podem ser utilizados as enxadas rotativas e grade a disco.
Escarificador com rolo destorrador. Fonte: JA Saúde Animal
2. Atingir todas as camadas da cama é essencial nesse momento, o que indica que a profundidade da reviragem irá depender da altura da cama, pois o intuito é atingir as camadas mais profundas do composto. Entretanto, normalmente temos como meta em grande parte das fazendas a profundidade de 30cm no momento da reviragem.
Concentre-se em áreas de maior uso para prevenir compactação excessiva, sendo pontos de atenção principalmente as áreas de entrada e saída da cama, ou seja, aquelas áreas que promovem acesso à pista de alimentação e aos bebedouros, pois nesses locais há a tendência de concentrar maior umidade.
3. Observe a textura da cama após a reviragem, avaliando a presença ou não de torrões ou até mesmo a formação de muito pó, o que pode indicar condições opostas de umidade que deverão ser ajustadas.
Reposição estratégica para manter a qualidade
Uma estratégia que pode ser utilizada é a reposição estratégica da cama, com intenção de evitar a decomposição excessiva e a perda de propriedades da cama.
Quando em condições ideais de umidade e temperatura da cama e reposição da cama é indicada a cada 6 meses a 1 ano, sendo indicado também que se mantenha cerca de 10 a 15cm do composto antigo para que o processo de compostagem seja acelerado no novo material.
Como realizar essa reposição estratégia?
- Reponha a cama regularmente, ajustando conforme necessário. Esse manejo vai ser essencial principalmente em lotes com maior lotação e/ou lotes com maior produção, pois esses animais irão consumir mais e consequentemente estercar mais, elevando a umidade da cama e a compactação;
- Utilize material fresco e de qualidade para repor a cama. Dentre os materiais mais utilizados, temos: maravalha, serragem, casca de café, caca de amendoim e, por fim, a palha de arroz. É importante que a fazenda detenha material extra para realizar reposições quando necessário;
- Monitore a textura da cama e a resposta das vacas para determinar a frequência de reposição.
Benefícios econômicos e sustentáveis do manejo consciente
Manejar a cama de forma eficiente e sustentável traz algum benefício para a propriedade? A resposta é sim!
Dentre os benefícios podemos citar:
- Melhoria na produção e qualidade do leite devido ao bem-estar das vacas;
- Redução nos custos com tratamentos veterinários devido à prevenção de doenças;
- Maior sustentabilidade econômica e ambiental.
Em resumo, a atenção detalhada ao manejo da cama no sistema de confinamento é um investimento essencial para propriedades de produção leiteira.
Mesmo sabendo que há uma enorme suscetibilidade da cama às condições ambientais a qual fica exposta, o controle desses fatores através do emprego de manejos corretos, devem ser independentes da estação do ano e do clima. Por isso, o monitoramento e o diagnóstico das variáveis deve ser frequente, pois sabemos que isso afeta diretamente o bem-estar e a saúde.
Ao equilibrarmos a umidade, realizar o revolvimento regular, repor o material adequadamente e controlar a temperatura da cama, os produtores não apenas garantem o conforto dos animais, mas também preservam a qualidade e a quantidade do leite produzido em sua propriedade, o que confere o sucesso do sistema.
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